Caros visitantes,
Eu e Mafuane não hesitamos em dizer que foi este o melhor encontro que experienciamos no Escrevivendo. Como disse a Mafu: "Ficou tudo redondo, lindo..." Neste relato que irão ler, saibam que se trata apenas de uma tentativa de representar a memória desse momento tão especial para nós.
Dia frio e nublado. Iniciamos nosso encontro, porém, inspirados por Eros, Psique, Afrodite e Marte, o que não poderia resultar em outra coisa senão muito ânimo e calor.
Após as devidas acomodações, troca de abraços e beijinhos habituais entre os participantes, perguntamos quem já havia visitado o blog e nos certificamos de que todos haviam recebido minhas sugestões a respeito da primeira proposta. Ficou combinado que não faríamos a troca em duplas desse texto, e sim iríamos realizar mais conferências para a próxima proposta, que não necessariamente anularia aquela, aliás. Todos responderam afirmativamente, então passei ao esclarecimento de uma questão recorrente em todos os textos, a qual eu já havia percebido quando da leitura que os autores haviam realizado no dia da produção: como a proposta era dirigir-se a Eros, pedindo-lhe inspiração, etc. (ver neste blog, à esquerda), os autores teriam de usar, obrigatoriamente, alguma forma de tratamento, exigência do gênero (mais ou menos como uma ode). Todos, sem exceção, misturaram as formas pronominais referentes ao tu, ao vós e ao você. A todos respondi individualmente, mas o que reforcei como um todo foi o fato de que, se essa mistura ocorrer, ela deve ser consciente, servir a um efeito de sentido diferente. Como exemplo, apresentamos o texto da Bruna (o primeiro postado aqui). Após conversarmos a respeito da adequação dos pronomes (tu, teu, tua, ti, etc., tens, podes, fazes; vós, vosso, vosso, vos, tendes, podeis, fazeis, etc.; você, seu, sua, tem, pode, faz, etc.; senhor = você, na conjugação), ela resolveu tratar Eros por "tu" durante todo o texto, apenas modificando seu tratamento na última frase, pois, uma vez conhecido e íntimo, o tratamento para com o ser amado muda. Perfeito!
A discussão sobre os pronomes estendeu-se a outros do português, a outras línguas, tendo sido discutidas várias práticas sociais e situações de comunicação. Como vêem, tentamos ao máximo não destratar nossa língua com mais gramaticalismo vazio e sim pensar a gramática na construção do texto, como os recursos estilísticos dos gêneros, dos quais fala Mikhail Bakhtin (1).
Logo depois, Mafuane fez a contação da história de Eros e Psique, seu nascimento e sorte. Foi emocionante e esclarecedora, tendo sido seguida de uma apresentação de slides muito sintética sobre o mesmo tema, rica em muitas imagens interessantes, como a do falo de Príapo, por exemplo (ver em "Leitura complementar", Eros x Príapo). Mafuane nos trouxe alguns livros interessantes, os quais constam de nossa bibliografia complementar.
Fizemos um breve intervalo e voltamos ao som de três canções: "Tango de Nancy", de Chico Buarque e Edu Lobo; "Explode coração", de Gonzaguinha, e "Sexo e amor", de Rita Lee, Roberto de Carvalho e Arnaldo Jabor (as três letras já estão aqui e, em breve, os áudios também estarão. Ver também em "Leitura complementar" a crônica de Arnaldo Jabor que suscitou a canção de Rita Lee). Fizemos a interpretação e análise de texto de "Explode coração", destacando as imagens que o compositor construiu. Eu e Mafuane falamos o menos possível: sempre tentamos ouvir mais que falar, embora tenhamos feito nossas provocações e mediações, dando o fecho quando necessário.
Após a introdução, com a música "Sexo e amor" (que foi eleito o tema deste blog), lemos o poema de Drummond "Amor - pois que é palavra essencial" (v. em "Leitura complementar"), que dialoga com a mitologia grega e com Platão, além de ser uma ode, como a que pedimos aos escreviventes.
Já estávamos, então, prontos para iniciar nossa conferência sobre o Banquete, de Platão. Mafuane fez um resumo do discurso de Aristófanes, somente para aquecer, uma vez que todos tiveram o texto em mãos durante toda a semana, para ler, anotar e refletir. Além das provocações do próprio Platão (v. alguns trechos em "Leitura complementar"), levamos algumas definições de dicionário (2) de erotismo e pornografia, bem fechadonas, a fim de as abrirmos. O resultado foi um qüiproquó daqueles, uma delícia. Eu e Mafu intervíamos aqui e ali, esclarecíamos, provocávamos mais, mas a cena era dos escreviventes. Enquanto rolava o bate-boca, muita gente anotava, rabiscava.
Uma das provocações foi a leitura de Mafuane de dois trechos de Budapeste (3), um de uma descrição mais idealizada e outra mais erotizada. Da primeira vez que Mafuane os leu, fê-lo como se os trechos fossem de autores diferentes, e deu às leituras entonações bem destoantes; da segunda vez, quando os escreviventes perceberam-se ludibriados, foi feita a releitura, em tom mais condizente com o texto integral. Objetivo: mostrar que, no texto, deve-se considerar o todo, porque nem sempre os fragmentos conseguem representá-lo. A linguagem artística é complexa, não se podendo simplificá-la com títulos e rótulos. Erótico ou pornográfico? Sabe-se lá!
Deu 13h35 e, já atrasadas, passamos nossa segunda proposta de produção de texto, não sem antes distribuir o material que eles teriam de ler durante a semana, para a próxima conferência, além daquele que eles pesquisam sempre por conta. Pedimos que elaborassem um texto discutindo o que é (natureza, essência), para que serve (prática social, situação de comunicação) e como se constrói (linguagem, escolhas lingüísticas, imagens) um texto erótico e/ou pornográfico. Eles poderão acrescentar experiências, memórias em geral (de vida, de livros, de filmes, etc.). Esperamos que daí saia um texto híbrido de estrutura argumentativa e narrativa. Não especificamos o gênero, o que vier será bem-vindo.
NOTAS:
1. BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. In: Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
2. HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
3. BUARQUE, Chico. Budapeste. São Paulo: Companhia das Letras, 2003
Um comentário:
Assino embaixo. Realmente foi o máximo. O início teórico é árduo e meio sem graça, mas essencial para a produção de textos.
As mediadoras se impoem pela competência, se adaptam, "pero sin perder la ternura jamás". A turma do fundão se comporta, participa, com seus comentários eternos e a energia flui.
Os novos já não são mais novos, também mergulham na sopa primordial que dá vida, em forma de texto, aos nossos devaneios. Amanhã tem mais. bedjo
san
Postar um comentário